Heródoto Barbeiro (*)
O debate sobre a reforma agrária está de volta. Depois de alguns anos esquecida nos escaninhos do Congresso, ela volta impulsionada por um movimento social. Os debates buscam as origens da concentração de terra no Brasil, onde 1% dos proprietários são donos de 50% das terras. Ou seja, a maior concentração fundiária do mundo.
O setor é acusado de perpetuar os latifúndios, reduzir a produção às monoculturas abastecedoras do mercado mundial e precarizar o trabalho no campo. A bancada ruralista no Legislativo é muito forte e dificilmente uma proposta de reforma agrária irá em frente. O primeiro ponto de impasse é como seriam pagas as indenizações das terras divididas.
O governo propõe o pagamento a longo prazo, por meio de títulos da dívida agrária; os proprietários querem pagamento à vista, em dinheiro. O líder dos apoiadores da reforma agrária defende que ela deve se iniciar pelo nordeste brasileiro. O objetivo do movimento é criar apoio econômico aos camponeses, prestar assistência social e formar cooperativas de crédito. Dada a resistência dos latifundiários, o movimento inicia uma marcha pelo Brasil com o slogan: ”Reforma agrária, na lei ou na marra”.
O presidente, recém empossado, apoia o movimento, assim como os partidos de esquerda, com destaque para o Partido Comunista Brasileiro. Reforma agrária está listada no plano de governo e o presidente promete ir em frente mesmo com a oposição dos partidos de direita, ligados aos ruralistas e muitos fortes, especialmente na região centro sul do país. As acusações partem de lado a lado.
A direita acusa o movimento de querer implantar um modelo soviético no campo. A esquerda, por sua vez, diz que a direita quer condenar o país a um eterno exportador de produtos primários, cujos preços no mercado mundial são ditados pelos compradores e não pelos vendedores. O plano é desapropriar as terras que estão às margens das estradas de rodagem federais para facilitar o escoamento da produção até os centros consumidores.
São frequentes as filas em praças públicas de pessoas que querem comprar feijão, arroz e milho diretamente de um caminhão. Há propaganda governamental que incentiva a população e isto apoia o movimento reformista. As Ligas Camponesas, organizadas pelo PCB, têm a liderança do deputado Francisco Julião, o que acirra ainda mais o debate no Congresso.
Na disputa política que se segue, o presidente João Goulart busca apoio popular. Convoca, em 13 de março de 1964, um grande comício no Rio de Janeiro. Anuncia para 200 mil pessoas a assinatura de um decreto que desapropria terras às margens das rodovias, ferrovias, açudes públicos e outras obras federais. Jango é proprietário de terras no sul e autoproclamado herdeiro do presidente Getúlio Vargas.
Está no poder desde a renúncia do titular do cargo, Jânio Quadros, e não se sabe por quanto tempo. O mandato expira em 1965 e ninguém sabe se haverá ou não eleição. Há um clima de golpe de estado no Brasil.
(*) – É jornalista do Record News, R7 e Nova Brasil (89.7), além de autor de livros destinados ao ensino de História, jornalismo, mídia training e budismo. Palestras e Midia Training (www.herodoto.com.br).