Valter Casarin (*)
Em todo o mundo, estima-se que 14% dos alimentos são jogados fora entre a colheita e o varejo, e que 17% são desperdiçados nos pontos de vendas e no processo de consumo.
Essa é uma preocupação global que diz respeito a todos os países, tanto os desenvolvidos quanto e os de baixa renda, uma vez que o desperdício se torna um grande e caro problema ambiental, social e econômico, que a cada ano, colabora para a perda de quase 1,3 bilhão de toneladas de alimentos no planeta.
Nesse cenário, cada pessoa desperdiça mais de 120 kg de alimentos por ano; e mais da metade, aproximadamente 75 kg, são desperdiçados dentro das casas. Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), um terço dos alimentos produzidos para consumo humano a cada ano é desperdiçado, ou seja, um em cada três produtos é produzido para ser jogado fora.
Uma triste realidade que mostra a preocupação geral com o problema do lixo doméstico. Isso gera um enorme paradoxo quando a ONU (Organização das Nações Unidas) contabiliza 811 milhões de pessoas no mundo passando fome e três bilhões sem acesso a uma alimentação saudável, para uma população mundial estimada em 8 bilhões.
Com esses números elevados, fica cada vez mais difícil acreditar que possamos atingir a meta de reduzir pela metade o desperdício doméstico de alimentos até 2030. Além disso, as perdas se somam às medidas do nível da produção e distribuição agrícola. Segundo a FAO, aproximadamente 15% dos alimentos produzidos no mundo se perdem antes mesmo de chegar ao mercado, o que corresponde ao equivalente de 400 bilhões de dólares por ano.
Entre os continentes que mais desperdiçam, destacamos a América do Norte e a Europa, mas também podemos evidenciar a Ásia industrializada, principalmente a China, que se apresenta na liderança. Somente esses territórios descartam entre 15 e 25% dos alimentos produzidos, no final da cadeia.
Nos países em desenvolvimento, a situação se inverte e 40% dos alimentos são desperdiçados na produção e armazenamento por falta de infraestrutura. Menos em número e mais frugais, os consumidores desses locais jogam menos fora. Uma vantagem infelizmente compensada por um sistema de produção pouco eficiente, mas que ainda assim os torna responsáveis por 44% do desperdício de alimentos em todo o mundo.
Para exemplificar, no Brasil, o desperdício anual está na ordem de 27 milhões de toneladas, onde 80% é perdido no manuseio, transporte e centrais de abastecimento. Cada brasileiro joga no lixo cerca de 60 kg de alimento por ano, uma quantidade que poderia alimentar mais de 12 milhões de pessoas anualmente.
Um custo significativo para o nosso planeta
O desperdício de alimentos tem um custo enorme para o nosso planeta e nossa economia. Esta é uma inconsistência ainda mais impressionante, uma vez que 690 milhões de pessoas sofreram de desnutrição em 2019. O custo econômico do descarte de alimentos é exuberante. Em todo o mundo, 1,3 bilhão de toneladas desperdiçadas representam aproximadamente US$ 1 bilhão a cada ano.
A superfície de terra e os meios para a produção que são explorados para produzir apenas os alimentos desperdiçados têm um impacto ambiental nocivo. Estima-se assim que o desperdício de alimentos é responsável por 8% das emissões de gases de efeito estufa. Além disso, o equivalente em água do Lago Genebra é desperdiçado todos os anos na produção de resíduos alimentares; e 30% da terra cultivada está ocupada com a produção de resíduos alimentares e, portanto, não é produtiva. Para completar, são desperdiçados sementes, fertilizantes e outros insumos importantes na exploração agropecuária.
Os motivos pelo qual toneladas de alimentos são desperdiçados estão relacionados a alta perecibilidade, as condições inadequadas de embalagem, manuseio, transporte e armazenamento. Podem ser citados também os fatores estéticos como justificativa para o desperdício de alimentos, pois muitos mercados consumidores rejeitam pequenos defeitos em frutas e legumes, por exemplo.
Diminuir a perda e o desperdício de alimentos contribuiria para a segurança alimentar, melhoraria a qualidade dos alimentos e reduziria as emissões de gases de efeito estufa. A agência de alimentos das Nações Unidas pede o combate a essa prática, que não é prerrogativa dos países ricos, como muitos acreditam.
Por isso, algumas práticas para reduzir o desperdício de alimentos dentro de casa são recomendadas, como: optar por alimentos produzidos localmente, isso permite as perdas de transporte e armazenamento e é importante para fomentar a economia local; preparar receitas mais sustentáveis, com partes dos alimentos que geralmente são jogados no lixo, como raízes, cascas e sementes; diminuir o volume e aumentar a frequência de compra de alimentos nos mercados, assim não é preciso estocar grandes quantidades, o que reduz o desperdício; armazenar de forma adequada as sobras dos alimentos; e fazer compostagem de resíduos orgânicos e produzir seu próprio fertilizante.
Portanto, quanto mais temos acesso a alimentos em grandes quantidades, mais os desperdiçamos. E o desperdício é um fator potencializador da insegurança alimentar e da fome no mundo. Isso nos leva a refletir como é importante conscientizar a população para um consumo consciente e ao mesmo tempo incentivar a cadeia produtiva e o varejo a rever alternativas para minimizar os efeitos do descarte de alimentos.
(*) Coordenador Científico da NPV.