Rica Mello (*)
Por que boa parte dos empresários ainda têm medo das férias?
Parece algo errado, estranho e “quando” as férias acontecem, muitas vezes, ficamos com um sentimento de culpa. Mas se traz algum alívio, já adianto que boa parte dos empresários pensam desta forma. A sensação ocorre por não termos certeza de que a empresa funcionará sem solavancos, e então, se algo der errado, a responsabilidade pelo erro é nossa por termos “largado tudo para trás”.
Ainda carregamos a crença de que o sucesso só nasce depois de muito sacrifício aliado a uma dedicação maternal, mas isso é totalmente ultrapassado. O gestor deve trabalhar bem e ser produtivo, mas não colocar isso à frente de tudo, a ponto de dizer que não tira férias ou pior, que não precisa dessa pausa, frase dita por muitos com muito orgulho.
A verdade é que isso está longe de ser um mérito e empresas que perpetuam essa mentalidade não estão olhando para um novo diálogo empresarial e por isso deixarão de ser relevantes com o passar dos anos. Desconectar-se um pouco do trabalho, leia-se não ignorá-lo totalmente e fingir que “não é comigo”, traz sim inúmeros benefícios para a saúde mental que também vai colaborar para executar as demandas de forma mais focada, produtiva, criativa e feliz.
Claro que não é necessário e nem recomendável se afastar por trinta dias corridos, fazendo uma referência ao antigo modelo que temos de férias, mas é possível descansar uma semana aqui, outra ali, e ao final do ano, ter tirado 60 dias de férias, o que deveria ser a meta de qualquer empresário. Afinal, estamos falando de uma pessoa que abdicou muitas vezes do Carnaval, do Natal, dos aniversários de familiares, e de tantos outros feriados, finais de semana, festinhas da escola dos filhos para que a sua empresa ou serviço prosperasse.
Clientes precisam ser atendidos, trabalhos entregues no prazo e muitas vezes não há equipe para tudo isso e o empreendedor estava lá, lutando enquanto a maioria descansava. Não tem jeito, a entrega maior é sempre dele. E aí, se identificou?
Mas depois de algum tempo nessa jornada, é preciso ter qualidade de vida.
Se você empreende há alguns anos, e já tem um negócio mais estruturado, você deve sim, preparar seu time e sua organização para maiores períodos da sua ausência, para que você possa chegar neste novo ponto de equilíbrio que passa a valorizar mais o seu ativo mais precioso: o tempo! Ganhar mais, crescer, prosperar, tudo isso compõe um importante cenário de desenvolvimento, tornando o empresário mais confiante.
Com confiança e tranquilidade todo o processo fica mais suave. E o mais importante, sentimos mais prazer no trabalho, que é a morada do empresário, e então, a cada entrega, nos aproximamos ainda mais do real propósito que move toda essa roda. Sendo realista, afirmo que é impossível desligar totalmente do seu negócio, e também reforço que não há mal algum nisto.
O empresário pode participar de algumas reuniões, responder mensagens, ou ainda, dedicar uma ou duas horinhas para algumas demandas rápidas no meio das suas férias. Entretanto, reforço que o ideal seria que ações estratégicas como fusões, aquisições, entrada em novos mercados ou lançamento de novos produtos sejam realizadas após a volta deste gestor.
Uma semana, provavelmente, não será um divisor de águas entre o sucesso ou fracasso do seu negócio, e se for, é só mudar os planos e não tirar férias exatamente neste período mais crítico, não é? Grandes instituições não interrompem suas operações porque o gestor está em férias, entretanto, a equipe precisa estar treinada e engajada com a cultura organizacional.
É essa filosofia que vai dominar o ambiente corporativo na ausência do gestor, sendo que a total compreensão e absorção influenciarão o comportamento dos empregados e molda a imagem corporativa passada ao público, o que impacta na aceitação e consumo dos produtos da marca, entre outros aspectos. Seria uma verdadeira prova de fogo.
Já pensou se a sua equipe consegue superar a meta sem você no comando? Sonho ou pesadelo? Deixo para você responder.
(*) – Ex-consultor estratégico da McKinsey e Bain & Company, possui MBA pela Kellogg School e especialização pela Singularity University (https://ricamello.com.br).