Heródoto Barbeiro (*)
Os militares criticam o sistema eleitoral brasileiro.
Em reuniões fechadas fazem duras críticas ao sistema adotado para a eleição, principalmente do presidente da República. Atribuem ao sistema uma forma institucionalizada de fraude a serviço de manter no poder a elite. A eleição, o sistema de votação, a cooptação do eleitor nos mais profundos rincões do país são apenas um cenário para vender interna e externamente que o Brasil é uma democracia representativa com liberdade de escolha de candidatos.
Principalmente a jovem oficialidade do exército não se conforma com os rumos do país e articula nos quartéis formas de combater o que consideram um abuso de poder. As reformas que o país tanto precisa, dizem, param quando esbarram em interesses consolidados e oligárquicos. Nada avança no Congresso Nacional
uma vez que ele é constituído pela maioria esmagadora dos representantes dos que detêm os privilégios no país.
As Forças Armadas estão politizadas e ninguém esconde isso, nem mesmo as suas lideranças que participam de reuniões em clubes militares, encontros em locais públicos e nas páginas de política dos veículos de comunicação. Os jornalistas avaliam que eles nunca deixaram de participar do processo político, mesmo porque três deles chegaram até mesmo à presidência da República. Defendem a bandeira da ordem e do progresso e das mudanças esperadas para que o país se torne uma força nas Américas.
Tempo de eleição no Brasil é tempo de crise. Os partidos não têm base popular, são organizações burocráticas atreladas aos interesses regionais e de classe.
São dominados pela oligarquia local e não têm alcance nacional. Na campanha presidencial se juntam a outros partidos de outros estados para formar uma coligação que dá certo ar de alcance nacional. Contudo, as alianças são costuradas sob a égide do tradicional “toma lá, dá cá”.
O candidato a presidente é escolhido pelos estados de economias mais fortes e com maior população. Alternam-se de uma forma que as disputas pelo cargo máximo da República sejam amenizadas e concentradas em banquetes e conchavos. Há quem atribua a falta de controle da economia às diferenças sociais. Debate-se uma proposta de fundação de um banco nacional de emissão e redescontos, semelhante ao Federal Reserve Bank dos Estados Unidos, com autonomia para cuidar da moeda e equilibrar as contas públicas deficitárias.
Contudo, o país está dividido, mais uma vez, entre dois candidatos à presidência e os ânimos cada vez mais acirrados. Não há programas de governo consolidados. Há acusações de lado a lado. A população assiste bestializada à troca de ofensas por meio das páginas dos jornais. Não se sabe o que vai acontecer. Os militares estão atentos ao embate e não escondem sua preferência por um dos candidatos.
As urnas estão prontas para receber os votos. Há uma manipulação clara, uma vez que o eleitor não sabe se o seu voto chega ao escolhido. As sessões eleitorais são manipuladas por cabos eleitorais. Muita gente não sabe exatamente do que se trata. As atas de apuração dos votos são fraudadas e enviadas para a contagem final. Os oligarcas destacam cabos eleitorais, muitos deles armados, para pressionar os que ousam perguntar em quem votar. Outros recebem pequenas recompensas em dinheiro ou presentes.
O candidato mineiro, Arthur Bernardes, é o favorito no esquema do “café com leite”. Teve uma prévia do que iria enfrentar quando desembarcou na estação central do Rio de Janeiro e é recebido com vaias, pedras, frutas pobres e muito xingamento. A muito custo chega ao encontro organizado pelo Partido Republicano na sede do Clube dos Diários. Está ameaçado de morte e pelas revoltas nos quartéis. A polícia é acionada para impedir que os manifestantes invadam o local e parem de atirar coisas contra o carro que transporta o oligarca mineiro.
Na imprensa, os comentários são que um homem com essa impopularidade não ganharia a eleição. O carioca Nilo Peçanha é o preferido pela oposição e pelos militares. Porém, a máquina eleitoral corrupta e manipuladora dá a última palavra e Arthur Bernardes é eleito em 1922. O que se espera do seu quadriênio é uma sucessão de revoltas civis e militares, com muitas mortes, intervenção nos estados e sob a égide do estado de sítio.
(*) – É jornalista R7, comentarista da Record News e Nova Brasil FM, além de autor de vários livros de sucesso (www.herodoto.com.br).