Bruno Rezende (*)
As tecnologias mais inovadoras a para inteligência corporativa ainda estão em estágios muito iniciais de maturação.
Poucas companhias conseguirão ir além do buzzword no curto prazo. Com a internet inundada de buzzwords rasas e desinformação, é crítico o acompanhamento de fontes confiáveis para real entendimento de potencialidades e mitos sobre as tecnologias que vão mudar o mundo nos próximos anos. A consultoria internacional Gartner, uma das principais fontes globais sobre tendências no mercado tech, divulgou a versão de 2021 do seu assim chamado “Technology Hype Cycle Chart”.
O gráfico, atualizado anualmente pela companhia, traz uma visão sobre o estado atual das principais tecnologias emergentes no mundo, sob a ótica de um ciclo teórico de difusão. O mais interessante sobre esse ciclo teórico de difusão é que, apesar de ser uma generalização, é muito difícil para qualquer tecnologia escapar do padrão. O que varia na verdade é quão rápido cada uma das tecnologias indicadas vai passar por todas as etapas descritas no Hype Cycle Chart.
São elas (em tradução livre): (i) technology trigger (gatilho tecnológico); (ii) peak of inflated expectations (pico das expectativas infladas); (iii) trough of disillusionment (vale da desilusão); (iv) slope of enlightenment (curva de aprendizado); (v) plateau of productivity (platô de produtividade). De maneira muito sucinta, o gatilho tecnológico acontece quando os primeiros sinais de uma inovação tecnológica aparecem na academia ou em alguma área de P&D, seja de startups, grandes corporações ou centros de pesquisa.
Na sequência, o pico das expectativas infladas ocorre quando o nível de maturidade da tecnologia ainda é muito baixo, mas a mídia e as redes sociais começam a apontá-la como “salvadora da humanidade”. A próxima etapa, o vale da desilusão, naturalmente acontece quando as empresas se dão conta de que não existe mágica, e que a aferição de valor com a tecnologia em questão demanda muito tempo, capital e atenção.
A curva de aprendizado, por sua vez, ocorre com os avanços e desenvolvimentos incrementais oriundos da frustração da etapa anterior. E finalmente o platô de produtividade acontece quando as soluções e os caminhos para implementação daquela tecnologia já estão maduros, e o risco de adoção é, consequentemente, baixo. E onde estão as principais tecnologias utilizadas para criação de soluções de inteligência corporativa neste ciclo teórico de difusão?
Olhando para o Hype Cycle Chart divulgado no ano passado, tínhamos as tecnologias denominadas embeded AI e explainable AI justamente no pico das expectativas infladas, com previsão para atingir o platô de produtividade respectivamente no período de 2 a 5 anos e 5 a 10 anos. Considerando que nenhuma dessas tecnologias entrou no gráfico de 2021, teriam elas atingido o vale da desilusão?
Ao que tudo indica, sim. Para se ter uma ideia do que isso significa, segundo a Gartner, quando as tecnologias saem do vale da desilusão para entrar na curva de aprendizado, nem 5% dos potenciais consumidores conseguiram completar uma implementação bem-sucedida. Não é fácil ser early adopter. E no gráfico de 2021? Quais são e onde estão as principais tecnologias emergentes utilizadas para a construção de soluções de inteligência corporativa?
Bem, ignorando as tecnologias que estão a mais de 10 anos de distância do plato de produtividade, como Quantum ML, podemos focar nos conceitos de Composable Applications (2 – 5 anos para atingir o plato) e Data Fabric (5 – 10 anos para atingir o plato), ambas justamente vivendo o pico das expectativas infladas. Importante destacar que propositalmente não estou trazendo os conceitos de Embeded AI, Explainable AI, Composable Applications e Data Fabric pois estes podem ser facilmente acessados através de uma pesquisa simples no Google.
Ao invés disso, a ideia do artigo é focar justamente no estágio de difusão das mesmas. A principal reflaxão que as duas últimas edições do Hype Cycle Chart nos traz é que existe um enorme descolamento entre o falar e o fazer quando se trata de soluções de inteligência corporativa baseadas em AI. Hoje literalmente todas as grandes empresas dizem que tem iniciativas neste sentido, realizam eventos de inovação, programas de conexão com start ups, posts no linkedin.
Todo mundo quer surfar o hype (com razão), mas só uma minuscula fração destas empresas vai ter realmente transformado os seus negócios pelo uso de AI dentro de 2 a 3 anos. Estas (não mais do que 5%) criarão gigantescas vantagens comparativa em seus mercados. Mas como já foi dito antes, estar na fronteira tecnológica, de fato, exige muito mais comprometimento com inovação do que a criação de uma área de transformação digital e um programa de conexão com start ups para postar no linkedin.
Exige investimento, foco e muita energia. Para os outros 95% das grandes empresas, que querem o benefício da fronteira tecnológica mas não querem o risco da adoção, o jeito é rechear o linkedin de postagens de inovação e esperar para fazer o catch up na segunda metade desta década.
E você, leitor? Vai inovar de verdade ou só vai postar?
(*) – É CEO da 4intelligence, startup de soluções que apoiam a tomada de decisão por meio da análise de dados ([email protected]).