Antonio Carlos Lopes (*)
Há uma polêmica entre historiadores se Pedro Alvares Cabral descobriu o Brasil ao acaso ou intencionalmente.
Uma corrente de estudiosos sustenta que Portugal já por aqui havia passado nos idos de 1948, em expedição de Duarte Pacheco Pereira. Consequentemente, o desembarque de Cabral em 1500 teria sido proposital, organizado e desfecho de uma bem pensada estratégia.
De fato, a questão acima é apenas base para eu traçar um paralelo e abrir relevante discussão. Deixo à parte o debate sobre a intencionalidade ou não de Cabral e destaco outro ponto: ao embarcar, ele certamente visava um destino, seja qual fosse.
É assim com todos nós, com todo o mundo. Se embarcamos em qualquer meio de transporte ou em qualquer jornada, empreitada, almejamos chegar aqui ou acolá.
Essa premissa é válida para empresas, instituições da sociedade civil, famílias, estados países etc. Certo? Talvez, sim. Talvez, não. Perdão por abdicar à objetividade ao responder. A questão é que o nem sim nem não é adequado ao caso de um país de nome Brasil. Nossa nau, lamentavelmente, parece que não vai a lugar algum, ao menos em passado recente. Se tivéssemos embarcado há 30 ou 40 anos, hoje estaríamos encalhados, todos de olhos vendados, fazendo acreditar que um dia chegaremos ao destino.
Mas não! Veja o que ocorre nossa saúde, por exemplo: faz cerca de quatro décadas que imprensa mostra hospitais lotados, sem infraestrutura, com falta de recursos humanos e gente largada em corredores. O que mudou? Também de 40 anos atrás são as denúncias de que escolas médicas são abertas sem hospital escola, sem corpo docente qualificado, com falhas na grade pedagógica e outros problemas. O que mudou?
Os médicos e outros profissionais denunciam igualmente há quatro décadas – no mínimo – que o Sistema Único de Saúde é subfinanciado, que faltam recursos à boa assistência aos cidadãos, que os recursos humanos recebem salários irrisórios, que a tabela SUS nunca é reajustada. O que mudou? Dezenas, centenas de vezes eu mesmo já bati na tecla de que saúde tem de ser prioridade no Brasil. Que deve ser política de Estado, não plataforma de partido. Não só eu. Muitos defendem essa tese há mais de quarenta anos. O que mudou?
Claro que isso não ocorre exclusivamente na saúde. Se pegarmos a área de Educação, os gargalos são recorrentes. A segurança pública traz falhas históricas, assim como transporte, moradia etc. Agora sou eu quem pergunto: o que queremos os brasileiros? Até quando manteremos a venda nos olhos, nutriremos a falsa fé de que estamos avançando e seguiremos encalhados?
Sim, estamos encalhados no atraso. Daí eu sugerir reflexão e ação quanto a isso por parte de todos, com urgência. Só assim, em um futuro – Deus queira – não muito distante, não amargaremos omissões vergonhosas e de doer a alma, como a de ser o único país do planeta a deixar seu povo ir a óbito por falta de oxigênio – o que ocorre agora no Amazonas, no Pará e sabe-se mais onde.
É triste!
(*) – É presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.