Heródoto Barbeiro (*)
Um simples resultado de um simples exame médico pode provocar uma crise política.
Estamos no Brasil onde tudo é possível, até mesmo assistir a um ardente debate se o chefe de governo tem ou não a obrigação de expor em público uma avaliação de sua saúde. Para variar, a polêmica tem duros contendores de lado a lado.
Os mais influenciados pelas ideias do liberalismo político argumentam que ele tem as mesmas garantias da lei que um cidadão comum, ou seja o direito a intimidade e a publicação do resultado dos exames é de sua única e exclusiva vontade.
Todos concordam que uma pessoa quando assume um cargo público perde parte de sua privacidade, mas há um limite em expor fatos de sua vida pessoal. Por outro lado, argumenta a oposição, a saúde dele é questão de Estado e não de vida privada. Por isso todos têm o direito de ver o que dizem os médicos a respeito de sua avaliação de saúde. Ela pode comprometer os destinos do governo e diretamente a vida de milhões de brasileiros espalhados pelo território nacional.
Há debates públicos inflamados entre as partes. O estado físico do chefe de estado foi alvo de uma reunião em São Paulo. Um líder da oposição faz um discurso emocional e ganha aplausos da plateia quando reitera que o povo tem o direito e o dever de exigir o resultado de um exame médico legal e que o resultado pode mudar os rumos do governo, que considera tão enfermo como o seu chefe.
Há uma dúvida se o chefe de estado é ou não um demente e que se dever permitir que continue à frente dos negócios do Brasil e se isso pode provocar um dano irreparável à sociedade brasileira. Assim o deputado denuncia o hospital responsável pelos exames clínicos de falsear a verdade, por incapacidade ou por cruel má fé. Sustenta que é uma forma ardilosa de não permitir que o poder não sai do círculo de pessoas que o cercam nos palácios.
Nada acontece aos acusadores que consideram um embuste e os danos que expõem a população e a economia do país. Afinal governos estrangeiros estão de olho no que se passa no centro do poder na capital do país e avaliam se vale ou não apena se arriscar a se envolver em uma questão, que, à princípio só interessa ao próprio país.
Veículos de comunicação não dão trégua. Jornalistas reviram diariamente os corredores do poder em busca de novas notícias sobre o estado real de saúde do chefe de governo. As avaliações saem do campo médico, desaguam no debate político e terminam nos grupos apaixonados que defendem ou atacam o chefe. O que fazer? Afinal sua excelência demonstra sinais de debilidade, demência ou qualquer outro sintoma aparente de incapacidade física.
A oposição republicana insiste na mídia que sim. Que os áulicos escondem a real situação da saúde do imperador para permitir que a sucessão se faça sem ameaça de mudança do regime. Os propagadores do republicanismo estão espalhados no exército, nas escola de formação de oficiais, nos clubes políticos, partidos e até mesmo no parlamento onde atuam deputados republicanos eleitos em plena monarquia.
Ao imperador resta pouco espaço para a defesa. Está velho, alquebrado, e sua vontade é passar o trono para a filha Isabel e se recolher em uma casa de repouso. Depois de quase 50 anos à frente da chefia do estado do Império Brasileiro, dom Pedro II não tem forças para se opor aos que desejam a troca da monarquia pela república.
O império esgota-se, não tem condições de resolver as contradições que ele mesmo gerou. Com ou sem a divulgação do atestado médico vai cair e dar lugar à república.
(*) – É editor chefe e âncora do Jornal da Record News em multiplataforma (www.herodoto.com.br).