O pavio de ouro
Ele era um latifundiário e como tal fazia parte da elite nacional. Era incomum que um homem de sua origem difundisse discursos contra a destruição das matas.
Afinal a sua própria família havia destruído boa parte da cobertura florestal para desenvolver atividades agrícolas. Elas eram exportadas e com o ganho era possível manter uma vida de fausto, com filhos estudando no exterior e parentes participando do governo local. A origem da riqueza estava na terra, portanto nada mais justo que ela fosse preparada para atividades que rendessem bons ganhos.
Os indígenas que insistiam em permanecer nas redondezas da fazenda eram pacíficos, e optaram por fugir para o interior, para outras matas, longe da sociedade dos brancos com os seus costumes estranhos. Mas a derrubada da floresta sempre andou nos seus calcanhares.
Era preciso buscar lugares bem longe das fronteiras agrícolas, das fazendas de criação de gado bovino e dos plantations monocultores. Eram desprezados como mão de obra, mesmo barata, quase de graça, pela sua cultura de baixa produtividade.
Destruir matas virgens, como até agora se tem praticado no Brasil, é crime horrendo e grande insulto feito à mesma natureza. Que defesa produziremos no tribunal da Razão, quando os nossos netos nos acusarem de fatos tão culposos? Insistia ele diante da oposição de novos predadores impacientes em implantar seus latifúndios.
O método mais prático era de origem indígena, porém em grandes proporções : as queimadas. Elas eram praticadas antes mesmo da colonização se iniciar no Brasil e tinha o nome de coivara. As mulheres índias limpavam pequenos espaços na floresta e punham fogo.
O fogo era o instrumento agrícola mais barato e eficaz e ainda alimentava o mito que as cinzas eram capazes de fertilizar o solo. Depois de pôr abaixo amplas áreas de cobertura florestal, o empreendimento de grande porte tomava ímpeto na época da estiagem, com a vegetação seca, de fácil combustão.
Não havia nenhuma preocupação qual o tamanho da área queimada, as florestas eram infindáveis. O jovem fazendeiro, defensor das matas, foi mandado pela família para estudar na Europa. Passou por lá uns 30 anos, especializou-se em mineralogia, bem longe das florestas do seu país que insistia em proteger.
Foi reconhecido como cientista em academias alemã e austríaca e acabou sendo contratado para ser o diretor dos bosques nacionais. Apenas um ano antes do movimento que separou a colônia da metrópole ele chegou ao Brasil, perto das matas que tanto defendia.
Tinha consciência que ela eram frágeis, finitas, importantes para a sobrevivência humana, e que se não lutasse pela sua preservação seria cobrado pelos seus descendentes.
Sua luta não terminou com a sua saída do governo imperial. Continuou na assembleia nacional constituinte, era deputado, até que o governo mandou fechar o parlamento.
José Bonifácio de Andrada e Silva foi exilado pelo imperador e só voltou depois de sua abdicação para ser o tutor do jovem Dom Pedro II.
(*) – É editor chefe e âncora do Jornal da Record News em multiplataforma (www.herodoto.com.br).