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O Poder dos Incentivos Fiscais à Produção Audiovisual

em Economia da Criatividade
quinta-feira, 30 de junho de 2022

Muito tem se falado sobre a Lei Rouanet nos últimos meses devido à polêmica que começou com a crítica do cantor sertanejo Zé Neto, da dupla com Cristiano, à cantora Anitta e à lei mencionada. O cantor, durante um de seus shows, se vangloriou ao dizer não depender da Lei de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet, que autoriza produtores a buscarem investimento privado para financiar iniciativas culturais.

Acontece que, apesar de atacar o projeto, o sertanejo faz apresentações com verbas de prefeituras, o que gerou ataques ao sertanejo. Outro fator que fez com que os questionamentos ligados à a origem do dinheiro que paga o cachê dos cantores sertanejos se intensificassem foi a divulgação da informação de que Gusttavo Lima se apresentaria numa pequena cidade de Minas Gerais por um cachê milionário, que seria pago com receita municipal destinada à fins como saúde, educação e infraestrutura.

A partir disso, formou-se um debate sobre as críticas à Lei Rouanet, cujos projetos passam por vários critérios e controles, e os shows pagos pelas prefeituras, feitos sem licitação.

Apesar de muito polêmica, essa lei incentivou e ainda fomenta peças de teatro, shows e cinema. Filmes como Carandiru, Bicho De Sete Cabeças, Central do Brasil e Dois Filhos de Francisco são alguns dos premiados longa metragens produzidos com o incentivo à cultura.

Para acessar a Lei Rouanet, os autores precisam submeter seus projetos à Secretaria Especial da Cultura onde os mesmos passam por avaliação do órgão. O projeto é aprovado desde que siga os requisitos estabelecidos pela lei. Com isso, o autor é autorizado a captar dinheiro através de doações ou patrocínio. Os incentivadores podem então deduzir uma parte ou 100% do valor investido do imposto de renda deles.

Nos Estados Unidos, país onde a indústria do entretenimento é extremamente lucrativa, os incentivos fiscais destinados à produções audiovisuais são o que move a indústria cinematográfica norte-americana.­­

Eu trabalho para a organização que cuida do programa de incentivo fiscal à produção cinematográfica de longa metragens e seriados do Estado de Washington. Diferente do que acontece no Brasil, onde o incentivo é federal, aqui nos Estados Unidos cada estado é responsável por seu programa de incentivo e pela captação dos recursos através das empresas interessadas em deduzir o valor investido em seus impostos de renda.

Não é a toa que os estados da California e New York lideram em locações que se tornaram icônicas através dos filmes. A California tem um limite anual de 330 milhões de dólares para usar em incentivo incentivo fiscal, já em Nova York o limite é de 420 milhões.

Desde que o estado da Georgia expandiu seu programa de incentivo fiscal e atraiu a construção de estúdios da Marvel em Atlanta, o setor não pára de crescer, alcançando a aprovação de um limite incrível de 1.2 bilhão de dólares em créditos fiscais.

Com o boom do setor durante a pandemia e a popularidade dos serviços de streaming, a demanda por conteúdo cresceu muito. Com um público cada vez mais criterioso e voraz, a busca por autenticidade nas histórias contadas através das telas vem levando as produções a locações cada vez mais diversas. Em decorrer disso, cada vez mais estados vêm voltando a atenção à sua indústria cinematográfica, visto que a produção de um filme ou uma série tem um retorno expressivo para o estado.

Meu trabalho para o governo de Washington envolve analisar os orçamentos dos filmes e séries que vêm filmar aqui e reembolsar essas produções através do incentivo fiscal do estado.

Eu trabalho analisando orçamentos de diversos tamanhos, que vão de alguns poucos milhões a produções mais caras, com atores aclamados pelo público. É sempre muito interessante trabalhar com cada produção e suas diversas peculiaridades. Muitos empregos são gerados e o setor terciário inteiro da economia é impactado, desde a compra de alguns items no mercadinho perto da locação, até o turismo gerado devido à uma cena icônica.

Num país lindo e tão diverso como o Brasil, imagina se a indústria audiovisual tivesse um verdadeiro e consistente incentivo do governo? Imagina atingir um setor inteiro da economia, gerar centenas de empregos e como resultado disso poder compartilhar com o mundo o talento dos nossos atores, diretores, produtores e tantos outros profissionais dessa indústria, além de exaltar a beleza e diversidade das paisagens brasileiras, incentivando o turismo para essas regiões. Já pensou?!

Marina Vecchi é Produtora Audiovisual e Mestre em Produção de Cinema pela Full Sail University, nos Estados Unidos. Marina atuou no setor de Home Entertainment da Sony Pictures Brasil como Assessora de Imprensa. Já nos Estados Unidos, trabalhou como assistente de produção em séries como “Westworld”, “Kidding”, produzida e protagonizada por Jim Carrey, o clássico da tv americana “The Goldbergs” e a série original do Youtube vencedora do prêmio Emmy 2020, ‘Could You Survive the Movies?’. Agora baseada em Seattle, Marina atua no departamento de cinema do estado de Washington na aprovação e suporte de produções cinematográficas e séries de tv produzidas na região com o incentivo do estado.